A notável desigualdade que estigmatiza a sociedade brasileira se apresenta
também, com igual intensidade, no Ensino Superior. Nossas Universidades
Públicas caracterizam-se por apresentarem um padrão de qualidade invejável para
países em desenvolvimento similares ao do Brasil. Todavia, mesmo com esse
expressivo parque universitário, nossas taxas de matrícula no Ensino Superior
são bem inferiores às observadas nesses países e, também, menores que as
registradas em vizinhos – como Bolívia ou Paraguai.
Os problemas que advêm dessa reduzida taxa de matrículas no Ensino Superior agravam-se quando percebemos que a dinâmica que envolve o acesso às IES é notadamente voltada para uma pequena parcela da sociedade, privilegiada com uma qualidade melhor no ensino básico e, de certa forma, sedimentada na intenção clara de aprovação em Universidades, sobretudo, Públicas.
Existem duas razões que nos levam a refletir sobre os problemas expostos
acima. A primeira é a gritante injustiça social trazida por esse panorama. Há
um grande número de estudantes vindos das escolas públicas do Ensino Médio que,
mesmo com as oportunidades bem menores que tiveram, quando comparados à maioria
de seus colegas vindos das escolas privadas, também chegam à Universidade
Pública preparados para prosseguir suas vidas acadêmicas, mas, por diferenças
pouco relevantes de pontuação em um exame de acesso, não conseguem vagas. Há
outros, com o mesmo preparo, que nem podem disputar uma vaga nas Instituições
Públicas, porque necessitam conciliar estudo e trabalho e, ainda, porque
desejam seguir uma carreira que não lhes oferece essa possibilidade.
A segunda razão é o risco de comprometer a qualidade do Sistema Federal de
Ensino Superior, pois na proporção em que os recursos investidos pelo Estado
nesse nível de ensino forem entendidos como direcionados para uma camada
privilegiada da população, a consolidação do regime democrático, que todos
desejamos, não acontecerá e poderá acarretar a migração, para outros programas
de Educação, dos investimentos que são importantes para a manutenção, a
ampliação e o crescimento qualitativo das Universidades Federais e Estaduais. A
expansão de matrículas com inclusão social, os cursos noturnos e a política de
cotas legitima os investimentos públicos feitos pelo Estado nas Universidades e
promove de forma pontual, porém não definitiva, um aprimoramento da democracia
educacional, uma diminuição vertente nas desigualdades raciais e sociais
existentes nas IES e um fortalecimento das universidades com garantia da
ampliação e extensão na atuação da instituição dentro de seu papel na
sociedade.
É evidente que essas políticas, por si só, não resolvem o problema das
desigualdades dentro dos espaços educacionais, mas nos fazem refletir de forma
mais presente nos reais problemas da Educação no Brasil em todos os âmbitos:
Ensino Básico e Ensino Superior. A defesa da política das cotas e um maior
acesso dos alunos de Escolas Públicas às Universidades Públicas (espaços seus
de direito) devem contribuir, de forma positiva, para uma nova realidade social
apontada por essa mudança. Porém, o fato de mais alunos negros, de baixa renda
ou oriundos de Escolas Públicas estarem nas Universidades não evidencia que o
Ensino Básico Público esteja apresentando vastas melhorias, tampouco que nos
acomodaremos com esse quadro e, portanto, nós – professores das redes públicas
de ensino – devemos lutar ainda mais por essas melhorias, pela formação
continuada, por melhores remunerações, por uma carreira digna e sistematizada,
por uma estruturação de qualidade nos espaços escolares, por melhores
materiais, por tudo que contribui com o crescimento e com o desenvolvimento do
ensino básico em todos os aspectos, pois agora teremos mais um aliado nessa
luta histórica - A Universidade Pública – que, assim como nós, não poderá ficar
omissa a essa realidade que se apresenta, nem poderá deixar de se posicionar e
contribuir com uma luta que agora também é sua.
Maurício Manoel – Professor efetivo de Língua
Portuguesa da Rede Estadual de Ensino, Membro da Academia de Letras e Artes do
Ceará, Produtor Cultural, Coordenador do projeto “Entrar na Universidade Para
Mudar a Sociedade”, membro de base do Sindicato
Apeoc.
Fonte: Sindicato Apeoc